A responsabilidade constitucional do Estado para com os brasileiros faz com que o direito à educação e à saúde, entre outros previstos no Art. 6º da Constituição de 1988, represente um fardo para o poder público.
A conta nem sempre fecha, o que torna essencial a parceria governamental com as instituições filantrópicas. Afinal, o 3º setor absorve boa parte das demandas sociais, garantindo o acesso das pessoas menos favorecidas aos serviços preconizados pela Carta Magna.
“Só esse suporte já tornaria as entidades filantrópicas no país justificáveis. Afinal, os governos não dão conta de resolver todos os problemas sociais, mas há entidades dispostas a ajudar. A questão é que elas fazem mais do que isso. A filantropia é um investimento que dá retorno certo, porque elas conseguem atender a uma grande parte da população com aportes que não condizem com o que entregam”, explica o advogado Tomáz de Aquino Rezende, especializado em assistência jurídica voltada para entidades sem fins lucrativos.
Os números mostram que o jurista tem razão. Segundo o relatório A contrapartida do setor filantrópico no Brasil, elaborado pelo Fórum Nacional das Instituições Filantrópicas (Fonif) a partir de dados oficiais, as entidades filantrópicas alcançam 89% da população brasileira, embora elas ainda estejam distribuídas em apenas 58% dos municípios. A conclusão do estudo é de que, para cada R$ 1 assegurado às filantrópicas em forma de imunidade tributária, há uma devolução de R$ 9,79 em forma de serviços considerados essenciais.
“Se você se deparasse com a chance de entrar em um fundo de investimentos com retorno financeiro de 979%, encararia a oportunidade? Refletindo de outra forma, pra ficar mais fácil: se surgisse bem diante dos seus olhos uma oferta de negócio que lhe permitisse ganhar quase dez vezes mais em relação ao valor investido, acreditaria nessa possibilidade a ponto de fazer um aporte financeiro? Antes que você responda, estou certo de que sua resposta é ‘sim’! Diante de um retorno desse tamanho, beira a irresponsabilidade ou a loucura não alocar nenhum recurso”, discute Dr. Tomáz.
Mas, para o advogado, não se trata apenas de considerar o tamanho da cobertura social. “O mais importante é reconhecer a capacidade de multiplicação entre as entidades do 3º setor. O levantamento do Fonif indica que, para cada um real de imunidade tributária, as instituições devolvem R$ 9,79 – alcançando aquela margem trazida inicialmente. Portanto, ainda que tenham semelhanças, as palavras utopia e filantropia remetem a universos bastante distantes. As entidades desprezam os próprios limites para transformar a vida de muitas pessoas”.
De volta ao estudo da Fonif, se por um lado a imunidade conferida ao 3º setor significou um pequena parcela de 4,3% dos gastos tributários, por outro isso resultou em 230 milhões de procedimentos hospitalares, 778 mil bolsas de estudo concedidas a alunos de baixa renda e à inclusão de 625 mil pessoas em situação de alta vulnerabilidade social, que simplesmente não tinham acesso aos serviços essenciais de responsabilidade do Estado.
Portanto, a filantropia, que tenta superar diuturnamente o crime moral de ser associada a uma caridade excessiva por parte do poder público, é quem retribui o máximo possível os parcos investimentos que recebe das três esferas do poder executivo. Não é mágica, mas desprendimento e vocação para de fato levar mudanças profundas à sociedade.
“Talvez pelo fato de viver em busca de resultados que se apresentam à margem dos interesses político-partidários, seus efeitos não apareçam tanto quanto deveriam. Mas eles estão por toda a parte, graças a pessoas e a empresas que ainda depositam confiança no 3º setor. Então reitero a pergunta inicial, mas numa outra perspectiva: quanto deveria ser investido nas transformações sociais encabeçadas pelas filantrópicas? Deixo a reflexão para você”, finaliza Aquino.